Após a tramitação e aprovação sem alterações nas comissões obrigatórias da Câmara dos Deputados, o PL 3831/2015, que estabelece normas gerais para a negociação coletiva na administração pública direta, nas autarquias e nas fundações públicas dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por tramitar em caráter conclusivo nas comissões da Câmara dos Deputados, cumpre o prazo regimental de cinco sessões a partir de 05/10/2017 para apresentação de recurso. Em não havendo recurso o texto aprovado segue direto para a sanção presidencial, tornando-se lei a partir daí.
Entretanto, atendendo à solicitação do “Sindicâmara” – “entidade” que não acompanha os debates do conjunto dos servidores públicos (nem na instituição onde trabalham seus pretensos filiados) e que ainda sequer conseguiu a realização de assembleia da sua pretensa base para a criação da pretensa entidade, o Deputado Alberto Fraga (DEM/DF), apresentou, em 11 de outubro último, à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, recurso solicitando levar o PL 3831/2015 ao plenário da Casa onde há o risco regimental de alteração, ou até de rejeição da matéria. A apresentação desse recurso demonstra total desinformação e desconhecimento por parte do deputado de todo o debate feito nas duas Casas do Congresso Nacional por parlamentares dos principais partidos da base do governo e da oposição juntamente com entidades sindicais das três esferas de governo, além de especialistas em gestão de pessoas e negociação coletiva.
A apresentação desse recurso demonstra também o desconhecimento da história luta dos trabalhadores no serviço público iniciada durante o processo constituinte há mais de 30 anos, quando se buscava o reconhecimento da atuação sindical desses trabalhadores. Desde àquela época os trabalhadores no serviço público, que usavam as estruturas associativas e até as de atividades recreativas como forma de organização e atuação na luta por direitos, melhores condições de trabalho e de remuneração, lutavam também pelo direito à organização e atuação sindical plena e efetiva, incluídos aí os direitos à negociação coletiva e à greve como forma última de luta por seus objetivos de classe. Com essa postura, o deputado, desinformado com o apoio de um grupo de servidores que se apresentam (sem ser, até o momento) como lideranças políticas representantes de servidores de uma instituição do Legislativo Federal, demonstram ainda desconhecer a importância da aprovação da redação do PL 3831/2015 como foi sancionado pelo Senado e pelas comissões da Câmara dos Deputados na sua forma original como vitória dos servidores e do Estado Brasileiro.
Em relação ao requerimento apresentado está demonstrada a fraqueza na argumentação do requerimento. Inicialmente o proponente alega que “a discussão somente no âmbito das Comissões deixaria de fora importantes contribuições para o tema”. Essa alegação já deixa claro o desconhecimento do debate profícuo e positivo realizado tanto no Senado Federal, quanto na Câmara dos Deputados, inclusive com a realização de audiências públicas nas duas Casas, com a participação dos diversos segmentos interessados e conhecedores do tema. É alegado também que os artigos 10 e 11 do PL, que tratam da abrangência e do objeto das negociações, respectivamente, apresentam “risco para o interesse público, para o Poder Estatal e para o servidor individual e coletivamente”. Entretanto, não dizem os defensores do recurso que o artigo 12 do PL 3831/15 determina a paridade entre representantes dos servidores e empregados públicos e os representantes do ente estatal respectivo, que inclusive determinam as pautas de cada reunião. Não informam também que, diferente do anunciado nas discussões da reforma trabalhista, para trabalhadores no serviço público não existe a possibilidade de prevalência do negociado sobre o legislado, sendo obrigatório o encaminhamento do resultado das negociações na forma de projeto de lei, medida provisória, ou ainda proposta de emenda constitucional ao respectivo parlamento, onde deverá ser objeto de debate e deliberação para que se torne lei, quando terá sua vigência determinada. Apenas as deliberações de cunho infralegal, que podem ser efetivadas através de decretos e portarias dispensariam a chancela do Legislativo. Lembramos ainda que, pelo próprio Projeto, os limites das negociações estão condicionados às prerrogativas, atribuições e competências dos representantes das duas bancadas participantes do processo. Da mesma forma, não é mencionado na justificativa do recurso o constante do parágrafo 6º do mesmo artigo 12 do PL 3831/15, que determina que, “nas hipóteses em que a negociação ultrapasse os limites de autonomia concedidos aos representantes, a reunião será suspensa para que se colha o posicionamento oficial da entidade sindical ou de classe e do ente público respectivo, necessário para o prosseguimento das tratativas”.
Por fim, o recurso encabeçado pelo Deputado Alberto Fraga (DEM/DF), raso nas suas duas frágeis e inconsistentes argumentações não tem a menor condição de sequer ser apreciado pelo plenário da Câmara dos Deputados, devendo ser trabalhada a sua retirada através da coleta de assinaturas contra esse recurso. E, em caso de ser efetivamente levado adiante, que seja derrotado, garantindo a remessa imediata para a sanção do Presidente da República, a fim de que finalmente seja garantida a terceira “perna” desse tripé da atuação sindical, formado pelos direitos à organização sindical, à negociação coletiva e à greve para os trabalhadores no serviço público brasileiro. Um fato histórico altamente positivo para a classe trabalhadora em tempos de ataques frontais aos seus direitos.
Vladimir Nepomuceno*
**Servidor público federal aposentado; Dirigente sindical com atuação em entidades nacionais nas áreas da administração pública e seguridade social de 1987 à 2003; Dirigente do Ministério do Planejamento na área de gestão de pessoas e membro da equipe de negociação do governo federal de 2003 à 2016. Atualmente é assessor e consultor de entidades sindicais, com foco em administração pública, negociação e processo legislativo.