As servidoras e os servidores públicos deveriam ter o direito assegurado de recomposição salarial no país. Porém, parte significativa do funcionalismo não tem tido esse direito respeitado em seus estados já a algum tempo, e quando ocorrem, muitas vezes, a porcentagem concedida é menor do que a esperada pelos trabalhadores e pelos sindicatos. Isso tem gerado diversos prejuízos para esses profissionais, levando-os a conviver com arrochos salariais, inflação altíssima e perda do poder de compra.
A Fenajud (Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário nos Estados), que tem feito uma campanha nacional, desde o início do mês de março deste ano, tem falado sobre a importância desse direito, com o intuito de desfazer os mitos que rondam o tema. A entidade, nesta semana, buscou ouvir especialistas que explicaram de forma clara e objetiva como acontece a recomposição salarial no funcionalismo público – mais especificamente no Judiciário, e como a ausência do direito pode afetar a economia no Brasil.
A Federação conversou com exclusividade com o economista do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Thiago Rodarte. Ele disse que “A importância da data-base se dá pelo fato de que, do ponto de vista prático, nos entes onde as categorias têm esse direito previsto em Lei a sua efetivação é assegurada. Em Minas Gerais, por exemplo, desde a implantação da lei de data-base os servidores do TJ sempre tiveram, mesmo que com atraso, a correção dos seus vencimentos (na maioria das vezes) pela inflação. Em outros Estados onde não há lei de data-base isso não necessariamente acontece, mesmo com dispositivo constitucional que garante a revisão geral anual”, cita.
O economista e outros especialistas que atuam pelo Dieese apontam que “A característica principal relativa à questão da concessão de reajustes no setor público, assim como a geração de qualquer outra despesa – é a necessidade, devido ao princípio da legalidade, da existência de lei que preveja ou autorize aquela despesa. Sendo mais específico a despesa tem de estar prevista na Lei Orçamentária, ou então o orçamento tem de ser suplementado para abarcar a despesa.”.
Os profissionais citam ainda que a ausência de reajustes no funcionalismo gera prejuízos econômicos para o país, pois diminui a massa salarial impactando no consumo. “De acordo com dados da RAIS a massa salarial dos servidores estatutários em 2020 representava em média 26% da massa salarial do total de trabalhadores formalizados. Dessa forma a manutenção de reajustes salariais de forma regular ao longo do tempo para os servidores públicos pode contribuir para manter e até mesmo ampliar o mercado de consumo interno, o que leva a uma ampliação da renda da economia e até mesmo geração de empregos no setor privado. Esse efeito é particularmente mais significativo em estados onde a renda média é menor”, pontuam.
Outro ponto que tem dificultado a recomposição salarial da categoria é a dificuldade que algumas entidades encontram em dialogar com as Direções dos Tribunais. Para os especialistas do Dieese, “Isso decorre muito em função da inexistência de regulação da negociação coletiva no setor público como um todo. Vale lembrar que a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho já foi recepcionada pelo ordenamento jurídico brasileiro, mas ainda não está sendo cumprida na prática”.
Situação nos estados
Em documento enviado à Fenajud, os especialistas citam alguns exemplos da situação dos reajustes em alguns estados. “Em São Paulo o reajuste de 10% concedido em março não cobriu a inflação de 10,8% do período de 01/03/2021 a 28/02/2022. Além disso, os servidores não tinham correção desde 2019. Na Bahia os servidores do TJ tiveram o último reajuste em 2015. Neste ano os servidores do Executivo baiano tiveram reajuste de 4% que não contemplou os servidores do judiciário. No Ceará os reajustes sempre acompanham o que é concedido aos servidores do Executivo mesmo que o TJ tenha margem para conceder índices superiores.
Já “Em Santa Catarina os servidores tiveram reajuste de 14,78% referente ao período entre maio de 2020 e dezembro de 2021. No Rio de Janeiro foi editada uma lei com previsão de reajuste de 26,11% parcelado em três anos. Em 2022 foi aplicado metade desse percentual, ou seja, 13,05%. Esse reajuste não cobre as perdas acumuladas desde o último reajuste em 2014, em especial se considerarmos a perda decorrente do aumento do desconto previdenciário de 11% para 14%”, pontuam.
“Na Paraíba a última revisão refere-se a 2018 e foi de 8%, sendo 5% a partir de janeiro de 2022 e 3% a partir de agosto de 2022. No Rio Grande do Sul não há reajuste desde 2014. Em Minas Gerais os servidores tiveram reajuste de 9,32%, referente às datas-bases atrasadas de 2020 e 2021”, aponta o documento enviado à Fenajud.
Em levantamento feito pela Fenajud, é possível verificar que há entidades filiadas à Fenajud que registram ausência de reposição inflacionária desde meados de 2014 e 2015, acumulando mais de 50% de perdas, devido a política de ataques ao funcionalismo adotada em algumas Unidades da Federação.
Luta nacional
A Fenajud tem atuado em busca dos direitos da categoria em todo país, como justificativa usa a necessidade de valorização desses profissionais, que se mantiveram atuantes e em suas funções durante toda a pandemia, com metas aumentadas, mesmo com redução de direitos efetivadas anteriormente – a exemplo da reforma da Previdência e Reforma Trabalhista, que foram extremamente prejudiciais para os servidores públicos.
A entidade ressalta ainda a importância das servidoras e dos servidores em apoiar suas entidades de base, ou seja, os sindicatos locais, filiando-se e participando das assembleias que discorrem sobre a recomposição salarial da categoria.