Os rumos do Poder Judiciário e sua responsabilidade no cenário atual são debatidos em Seminário

Atividade, realizada pela Fenajud e Sindjus-RS, envolveu sindicatos de diferentes estados e trabalhadores da base em Porto Alegre (RS). Entidades finalizaram Seminário com a “Carta de Porto Alegre” que traz um conjunto de denúncias sobre a situação enfrentada pelos trabalhadores do Poder Judiciário nos estados e aponta uma pauta reivindicatória comum para todas as entidades.

Porto Alegre (RS) foi palco de um debate imprescindível para os rumos do Poder Judiciário no país. Realizado pela Fenajud (Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário nos Estados), em parceria com o Sindjus-RS, os trabalhadores da base debateram “O papel do Poder Judiciário na conjuntura social, política e econômica do país e os desafios da atualidade” em um Seminário de Formação Sindical. A atividade aconteceu no dia 1º de agosto com a presença de representantes de sindicatos de trabalhadores da justiça de diversos estados. Durante todo o dia os participantes tiveram acesso a três painéis temáticos.

O primeiro deles aconteceu sob a mediação da coordenadora de Comunicação e Imprensa da Fenajud, Adriana Pondé, e do coordenador de relações de trabalho e assuntos jurídicos do Sindjus, Valdir Bueira. A primeira mesa tratou sobre “O Papel do Judiciário na Atual conjuntura e sua Democratização”, com explanações da juíza do trabalho e presidenta da Associação Juízes pela Democracia (AJD), Valdete Souto Severo, e do ex-governador do RS e ex-ministro da Justiça, Tarso Genro.

Na abertura, Adriana Pondé ressaltou a importância das atividades de formação sindical para fortalecer a luta da categoria. Enquanto o diretor do Sindjus, destacou a importância de discutir a democratização do Judiciário, enfatizando que a ampliação do controle social sobre ele é uma luta antiga da categoria.

Em sua fala, a juíza do trabalho Valdete Souto Severo apresentou um panorama do cenário político após a ditadura militar. Esclareceu, porém, que não houve um ajuste de contas sobre este período, uma vez que a abertura democrática “nunca rompeu efetivamente com as raízes dos poderes políticos econômicos que já ditavam as regras do jogo” no período de exceção. Sobre a conquista da Constituição Federal, Valdete apontou que o texto constitucional é um projeto de Estado e estabelece objetivos claros, como reduzir desigualdades sociais, garantir dignidade humana e combater a pobreza. A Constituição também deu força ao poder Judiciário para efetivamente se constituir como poder contra-hegemônico e garantir os direitos dos cidadãos. Mesmo assim, a magistrada destacou que alguns dispositivos jamais foram cumpridos e, na conjuntura atual, as garantias constitucionais são sistematicamente ignoradas. “Não vivemos mais numa realidade comprometida com aquilo que se construiu em 88”, pontuou. A juíza questionou, ainda, o papel do CNJ, que de mecanismo regulador, tem trilhado um caminho perigosamente tendencioso rumo à censura e perseguição política.

O ex-ministro da Justiça Tarso Genro fez uma explanação sobre as transformações históricas do modelo socioeconômico global e o processo de dominação do sistema financeiro sobre as democracias, o comportamento da sociedade e até sobre a formação de opinião dos indivíduos. Esse poder condiciona a grande maioria da sociedade a ver e pensar o mundo sob uma perspectiva orientada, a fim de atender aos interesses da classe dominante.

Sobre o papel das instituições de Estado na deterioração da democracia no país, o ex-governador recordou o período da ditadura militar, em que ficou nítida a existência de duas faces nos poderes (inclusive o Judiciário), uma exposta e outra oculta, esta última agindo à margem da institucionalidade. “O sistema de justiça sempre funcionou no Brasil através deste jogo entre o oculto e o aberto”, salientou, apontando que esse “jogo” ficou mais evidente com os recentes vazamentos de conversas entre magistrados e procuradores da operação Lava-Jato.

Após as exposições, Valdete Souto e Tarso Genro responderam a questionamentos dos participantes sobre os temas abordados.

“Dívida Pública e Previdência Social”

O primeiro painel da tarde, debateu a “Dívida Pública e Previdência Social”, e foi ministrado pelo auditor público externo do TCE/RS e membro da Auditoria Cidadã da Dívida, Amauri Perusso, e pela deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS). Atuaram como mediadores o diretor de política e formação sindical do Sindjus/RS e coordenador da regional sul da Fenajud, Marco Velleda, e a diretora de finanças e patrimônio do Sindjus/RS, Joseane Bronizaki.

Amauri apresentou um conjunto de dados para mostrar que, diferente do que o governo federal argumenta ao defender o ajuste fiscal, o que tem feito a dívida pública explodir não são os investimentos e gastos sociais, mas os mecanismos de política monetária do Banco Central, responsáveis por déficit nominal brutal e pela fabricação artificial da “crise”. Nessa lógica, o crescimento da dívida pública da União, que hoje ultrapassa os R$ 5,5 trilhões, é programado, e quanto mais se paga, mais se deve. “A dívida se realimenta, cria mecanismos de autossuperação e cresce por conta própria”, apontou o auditor. Ao mesmo tempo em que o país vivencia uma crise econômica, entretanto, o lucro dos bancos atinge patamares recordes no país. Amauri também apresentou dados sobre a dívida dos estados, especialmente o RS, que viu o montante quadruplicar com a submissão à política do governo FHC de obtenção de empréstimos junto a bancos privados.

Em sua explanação, a deputada federal Fernanda Melchionna ressaltou que o debate sobre a dívida é estrutural e precisa ser socializado o máximo possível com a população. Citou as dificuldades das bancadas de oposição no Congresso Nacional no atual cenário político, uma vez que, além da maioria dos parlamentares, o atual governo conta com o amplo apoio da mídia tradicional para manipular a opinião pública na defesa de suas reformas “antipovo”, reforçando a retórica falaciosa da necessidade dos cortes de gastos sociais para que o país não quebre. Fernanda denunciou que há uma tentativa em curso de calar as vozes democráticas. “A votação do primeiro turno da Reforma da Previdência foi um retrato da luta de classes no momento”, sentenciou. Na verdade, esclareceu a deputada, “esta receita econômica (de cortes) vai gerar ainda mais crise”, destacando o processo de precarização do trabalho no Brasil e da iminência de um aprofundamento no desmonte dos direitos trabalhistas, apontando, inclusive, a tentativa de atacar a estabilidade dos servidores públicos como sintomática dessa tendência.

Rede Nacional de Formação

O terceiro painel teve mediação do diretor de imprensa e divulgação do Sindjus/RS, Emanuel Dall Bello. O coordenador da região nordeste da Fenajud, Alexandre Santos, apresentou um módulo que integra a plataforma da Rede Nacional de Formação da Fenajud (Renaf) implantada pela entidade. Alexandre ressaltou que a iniciativa da Fenajud de fomentar e distribuir o conhecimento tem por finalidade contribuir para que “a classe trabalhadora possa se apropriar desse conhecimento e, a partir daí, começar seus movimentos de libertação”.

Em sua apresentação, o palestrante apresentou “Os dez princípios de acumulação de riqueza e de poder de Noam Chomsky”, trazendo elementos da obra do teórico anarcossindicalista estadounidense e provocando a reflexão por meio da contextualização com a realidade brasileira e com a conjuntura no âmbito do Poder Judiciário. Com base nessa análise, o painelista teceu críticas ao documento 319 do Banco Mundial, uma proposta de reforma do sistema judiciário da América Latina e do Caribe que, na prática, visa ajustar o funcionamento do Poder Judiciário a fim de atender a interesses específicos – os do poder econômico.

Carta de Porto Alegre

Ao final do seminário, o coordenador geral do Sindjus/RS, Fabiano Zalazar, fez a leitura da Carta de Porto Alegre, que traz um conjunto de denúncias sobre a situação enfrentada pelos trabalhadores do Poder Judiciário nos estados e aponta uma pauta reivindicatória comum para todas as entidades. O documento conta com uma análise da conjuntura e orientações para a luta da categoria.

Com informações do Sindjus-RS

 

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