8 de Março: É preciso restituir às mulheres sua luta e a verdade de sua história

Março, mês das mulheres. Mês em que tradicionalmente debatemos uma série de questões relacionadas às mulheres e sua luta histórica contra a desigualdade que se criou ao longo de séculos de opressão. Essa data, ao longo do tempo, virou alvo de uma série de clichês e tentativas de esvaziamento de seu sentido politico para transformá-lo em mais uma data para o lucro de um comércio que explora diversos estereótipos relacionados às mulheres, como a vaidade: são dias de beleza, muitos chocolates distribuídos Brasil afora e muitos “parabéns, guerreiras!” que não se traduzem em melhores oportunidades de tratamento equitativo, no fim da discriminação de gênero no trabalho ou na diminuição dos feminicídios e casos de violência sexual e moral praticados contra as mulheres.

Um exemplo dessa tentativa de esvaziamento que já está na hora de parar de reproduzir é a respeito da própria origem do 8 de março. A história comumente difundida no Brasil é que essa data surgiu em homenagem às 125 operárias que foram mortas durante um protesto numa fábrica dos Estados Unidos, em 25 de março de 1911. Porém, o primeiro dia de lutas das mulheres foi celebrado em 1909, com uma passeata que reuniu cerca de 15 mil mulheres nas ruas de Nova York, por melhores condições de trabalho.

Na Europa da época a situação não era diferente. Jornadas extenuantes de 16 horas de trabalho, seis dias por semana (algumas vezes também nos domingos) sem nenhuma proteção à maternidade, recebendo muito menos e com assédio constante dos patrões faziam parte das rotinas das mulheres, que começaram a se organizar em movimentos e a criar calendários próprios de organização. Em 1910, a alemã Clara Zetkin propõe a criação de uma jornada anual das mulheres de manifestação pelos seus direitos. O primeiro dia das mulheres foi celebrado em 19 de março de 1911, em fevereiro. Porém, em 1917, as trabalhadoras russas saíram às ruas em protesto contra o regime czarista e a grande fome e desemprego que estava havendo no país, bem como pela retirada da Rússia da Primeira Guerra Mundial.  No dia 23 de fevereiro do antigo calendário russo (e 8 de março no calendário gregoriano), uma manifestação gigantesca por “Pão e Paz” tomou as ruas da Rússia de fábrica em fábrica, tornou-se uma greve geral e foi fundamental para a derrubada do regime czarista e para Revolução Russa. Em 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) oficializou o 8 de março como Dia Internacional das Mulheres.

Ou seja, a história desse dia começou com muita luta contra a desigualdade, a injustiça, o massacre dos povos nas guerras e pelos direitos das mulheres, que foram protagonistas de um momento histórico e catalisadoras da revolta de um povo contra a tirania e a opressão. Ao atribuir a data à morte das mulheres na fábrica, mais uma vez tentam tirar nosso protagonismo e nos colocar na condição de vítimas. Já está na hora de conhecer a verdade e sair desse lugar, assumindo nossa posição de construtoras da nossa história e de nosso país.

Nós mulheres brasileiras estamos vivendo um momento extremamente delicado. Nunca fomos tão atingidas pelo desemprego como agora em nossa história recente, especialmente pós pandemia. Continuamos sendo mortas e lutamos diariamente para sermos respeitadas em nossos lares e locais de trabalho. Que a lembrança da origem de luta de nosso dia permaneça conosco e nos faça tomar novamente as ruas e lutar cada vez mais por dias melhores em nosso país.

Artigo de Ana Carolina Lôbo, coordenadora de Gênero, Etnia e Geracional

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